terça-feira, maio 26, 2009

Com vocês, Thomas Stearns Eliot (sim, eu também sempre quis saber o que o T. S. abreviava...)

(As traduções a seguir são um oferecimento de ossurtado.blogspot.com
ao poeta Augusto de Campos, com toda a joco-seriedade e irrestrito respeito.)

Lines for an Old Man

The tiger in the tiger-pit
Is not more irritable than I.
The whipping tail is not more still
Than when I smell the enemy
Writhing in the essential blood
Or dangling from the friendly tree.
When I lay bare the tooth of wit
The hissing over the archèd tongue
Is more affectionate than hate,
More bitter than the love of youth,
And inaccessible by the young.
Reflected from my golden eye
The dullard knows that he is mad.

Tell me if I am not glad!


VERSOS A UM HOMEM VELHO

O tigre na caverna do tigre
Não é mais irritável que eu.
A cauda de chicote é menos fixa
Que quando eu sinto o cheiro do inimigo
Retorcendo-se no sangue essencial
Ou pendurado na árvore amigável.
Se ponho à mostra o dente da argúcia
O assovio sobre a língua em arco
É mais afetuoso do que o ódio,
Mais amargo que um amor juvenil,
E inacessível a quem mal viveu.
Refletido em meu olhar dourado
O bobalhão sabe que enlouqueceu.

Diga pra mim se alegre não sou eu!

***

(segunda versão:)

VERSINHOS A UM VELHINHO AÍ

Um trigue muito susse, internado,
Não surta mais facinho do que eu.
A cauda do bichano não se estica
Mais que se eu farejo um mui amigo
Todo torto ali num básico sanguinho
Ou balangando numa árvore querida.
Se chego mais comeu dente esperto
O pissiu que sai do meio da linguinha
É mais fofo que o rancor de muito otário,
Mais amargo do que o teu primeiro amor,
E cê não saca se por essas não passou.
Bisolhando-se no espelho do meu zóio
O lóki nem pirou e já enlouqueceu.

Existe alguém mais comédia do que eu?

T.S.Eliot
I.J.Santana

terça-feira, maio 19, 2009

Uma postagem desabafo sobre tradução de poesia, com direito a um Dylan Thomas safra 1933...

Pois então - esses tempos eu comprei num sebo de alta periculosidade (é um perigo eu ser sugado a um lugar desses e não conseguir mais sair...) dois números da revista ET CETERA - literatura e arte - [ué? Literatura não é Arte?]) -

Tá vou tentar ser mais breve, mas tolerem os entretantos -

no número 5 (Maio/2005) havia (e continua lá) um artigo de Augusto de Campos sobre Dylan Thomas - seguido por três poemas traduzidos.

Certo, Augusto de Campos é um poeta fora de série, etc e tal e a coisa toda, mas eu tinha certeza de que havia algo ali que não estava totalmente escalafobético (na conotação de supimpa maravilhosíssimo e também ótimo máximo...) -

fui lendo e degustando os saberes e estilo irretocável do príncipe dos poetas concretistas quando de repente (não mais que de repente) ele desliza no tomate e enfia a fuça na maionese (eu tinha a certeza que isso ia acontecer:) - senão vejam:

"Os poemas de Dylan que acompanham este estudo foram mais de uma vez vertidos para o português, mas nunca sob o critério da tradução-arte, que impõe que se recrie, a par da tensão emocional, a estrutura formal: o ritmo, a concentração e os jogos sonoros, e quando isto é possível, também o esquema rímico original. Não é fácil." [grifo meu]

O negócio é que o excelso Augusto julga que só quando é ele quem se dispõe a traduzir aparece automaticamente seu exclusivo "critério da tradução-arte"...

É de causar muita indignação!

Pois o fato é que a obra poética de Dylan Thomas já foi competentíssima e integralmente traduzida (com toda a arte, em minha modesta opinião) por Ivan Junqueira (não é por ser meu xará que afirmo isso) - e o poema In my craft or sullen art também recebeu excelente tratamento ao português brasileiro pelo brilhante tradutor Ivo Barroso - as traduções que estes dois fizeram deste poema podem ser conferidas aqui - e a tradução que Augusto apresentou poderia ser colocada no máximo em terceiro lugar entre as três...

Dos três poemas traduzidos que Augusto apresenta neste artigo na ET CETERA, um merece ser saudado como boa tradução (AND DEATH SHALL HAVE NO DOMINION - E A MORTE NÃO TERÁ DOMÍNIO) - o que significa um aproveitamento tradutório de 33,33%, que corresponde, na minha opinião, à média de aproveitamento geral da obra de Augusto de Campos, entre ensaios, traduções, poemas concretos e etc (tá, essa foi um pouco forte, mas acho que ele mereceu...)...

Por fim, visto que considerei fraquíssima a tradução de Augusto para THE FORCE THAT THROUGH THE GREEN FUSE DRIVES THE FLOWER (A FORÇA QUE O PAVIO VERDE CONDUZ À FLOR - só pelo título já dá pra ver que ele perdeu mesmo a mão no ritmo e na escolha de vocabulário, sem falar no detalhe mínimo para uma tradução: o significado, putzgrila!), apresento aqui uma tradução que, sem se arrogar ao critério de tradução-arte e patati-patatá, procura acertar na veia do poema.

THE FORCE THAT THROUGH THE GREEN FUSE DRIVES THE FLOWER
A FORÇA QUE ATRAVÉS DO FUSO VERDE PROPULSIONA A FLOR

The force that through the green fuse drives the flower
Drives my green age; that blasts the roots of trees
Is my destroyer.
And I am dumb to tell the crooked rose
My youth is bent by the same wintry fever.
A força que através do fuso verde propulsiona a flor
Propulsiona minha idade verde; que detona as raízes de árvores
É minha destruidora.
E eu fico mudo pra falar à rosa retorcida
Que minha juventude dobra-se à mesma febre de inverno.

The force that drives the water through the rocks
Drives my red blood; that dries the mouthing streams
Turns mine to wax.
And I am dumb to mouth unto my veins
How at the mountain spring the same mouth sucks.
A força que impulsiona a água através das pedras
Impulsiona meu sangue vermelho; que seca os jorros berrantes
Transforma o meu em cera.
E eu fico mudo pra berrar minhas veias adentro
Como à fonte da montanha a mesma boca suga.

The hand that whirls the water in the pool
Stirs the quicksand; that ropes the blowing wind
Hauls my shroud sail.
And I am dumb to tell the hanging man
How of my clay is made the hangman's lime.
A mão que redemoinha a água numa poça
Agita a areia movediça; que amarra o vento uivante
Arrasta minha vela-mortalha.
E eu fico mudo pra falar ao enforcado
Como de minha argila é feita do carrasco a cal.

The lips of time leech to the fountain head;
Love drips and gathers, but the fallen blood
Shall calm her sores.
And I am dumb to tell a weather's wind
How time has ticked a heaven round the stars.
Os lábios do tempo sanguessugam a cabeça-fonte;
O amor escorre e se acumula, mas o sangue derramado
Abrandará as feridas dela.
E eu fico mudo pra falar a um vento intempestivo
Como o tempo marca um firmamento em volta das estrelas.

And I am dumb to tell the lover's tomb
How at my sheet goes the same crooked worm.
E eu fico mudo pra falar à sepultura da amante
Como em meus lençóis se arrasta o mesmo verme retorcido.

Dylan Thomas (1933)
Ivan Justen Santana (2009)

sexta-feira, maio 15, 2009

POEMA IMEDIATO IMPROVISADO PARA GIANNA ROLAND, DE SEU AMADO IVAN

Um verso sem qualquer verbo
na redondilha perdido,
voz vazia no deserto,
num ritmo já por aqui do
bate-estaca regular
calculado pra embalar
corações número par;

pé direito em teto torto
feito a um calcanhar canhoto;
luva que perdeu a mão;
cais que aqui ficou sem porto;

não, não é aquela canção
da Adriana Calcanhoto:
são riscos pra descrever
eu e você, um sem o outro.

quarta-feira, maio 13, 2009

Sintonizando novamente a blogosfera

Topei com uma breve postagem-poema muito bacana de meu caro amigo Mario Negrello, cientista da inteligência humana. Resolvi prontamente fazer a tradução, e antecipo que um comentarista da referida postagem descreveu-a como "uma obra de Escher em palavras".

Senão vejamos...


The unfathomable of the wise

The unfathomable to the wise
Is the obvious to the dimwit
And vice-versa.

Who is who?


O insondável do sábio

O insondável ao sábio
É o óbvio ao estúpido
E vice-versa.

Qual é qual?



Texto original: Mário Negrello
Versão brasileira: Ivan Justen Santana

sexta-feira, maio 08, 2009

O POETAÇO E O POETENTO

O poetaço e o poetento
trombaram (que susto!) um com o outro –
o verbo veio violento
à boca do que era o mais douto:

“Eu faço, eu verso, eu aconteço
e esse universo vai ver só:
reconheces que não tem preço
o meu cantar de tom tão só?”

O mais humilde, nojentinho,
viu fim no meio do caminho
e disse ao vizinho, mesquinho:
“Não, não beberei deste vinho

passado que você fermenta.”
– enquanto a tardinha, agourenta,
morria sem um som plangente,
antipaticissimamente.

sexta-feira, maio 01, 2009

OVILEJOS EM FARRAPOS

Com coragem neste drama, ama.
Intimando a nota prima, rima.
Na vertigem do dilema, lema.

Sem vacilo em hora extrema
Trame um tema que resuma
Toda a terra ou lua alguma
E ame a rima como lema.

Chova uns pingos mas não trema.

Se o seu verso é pouco esperto perto
E as palavras não são cruas ruas
Nem apagam as velinhas linhas

Manje as canjas das galinhas
Demonstrando o ritmo certo
De belezas quase nuas,
Quase suas, quase minhas.

Nunca estanque um corte aberto:
Resta o grito no deserto.