domingo, janeiro 30, 2005

prepare o seu coração

deitado na grelha
ou flechado no espeto
mande muita brasa

encharque com maremotos
de molho de pimenta malagueta
feita em casa

acompanha chili ao chilique
caldo de sururu
e guarnições alla putanesca

servir pegando fogo:
quem comer mais e chorar menos
ganha o jogo

sábado, janeiro 29, 2005

agora se me pedirem prosa

Agora se me pedirem prosa, conto uma historinha, com direito a diálogos:

Fulano, passeando pela cidade, encontra seu amigo Sicrano:
- Então Sicrano, comeu a Beltrana?
- Eu e a Beltrana estamos de rolo...
Aí Fulano abre o aurélio instalado no cérebro e confere, na 16a. acepção:
Rolo
16. Bras. Pop. Conflito ou briga em que se envolvem numerosas pessoas. [Sin., nesta acepç., quase todos eles bras. e pop.: adevão, água-suja, alteração, angu, angu-de-caroço, aperta-chico, aranzel, arranca-rabo, arranca-toco, arregaço, arrelia, arruaça, bababi, baderna, bafa, bafafá, bagaço, balaio-de-gatos, bambá, bambaquerê, banguelê, bangulê, banzé, banzé-de-cuia, banzeiro, bereré, berzabum, bochinche ou bochincho, bode, bololô, bruega, chinfrim, cocoré, coisa-feita, confusa, confusão, cu-de-boi, cu-de-gato, desordem, destranque, embrulhada, esbregue, esparrame ou esparramo, esporro, estalada, estrago, estralada, estripulia, estrupício, fandango, fecha, fecha-fecha, forrobodó, frege, frevo, fubá, furdúncio ou furdunço, fuzuê, gangolina, grude, pampeiro, pau, pega, pega-pega, perequê, perereco, pipoco, porqueira, quebra-quebra, quebra-pau, quebra-rabicho, quelelê ou quilelê, quizumba, rififi, rixa, safarrascada, salseiro, sangangu, sarapatel, sarilho, sarrabulhada, sarrabulho, sarrafascada, seribolo, sororó, surumbamba, sururu, sururuzada, tempo-quente, trabuzana ou tribuzana, trança, trovoada, turumbamba, turundundum.]

sexta-feira, janeiro 28, 2005

três trepadas intrépidas

o crepúsculo estripa o dia
a noite tripudia suas estripulias
e a madrugada cada vez mais arredia

quinta-feira, janeiro 27, 2005

beijos & beijos & beijos

**


PRIMEIRO BEIJO DE GOIABA

eu vi um primeiro beijo ontem
eu vi vários primeiros beijos
o meu primeiro beijo nunca acaba
o meu primeiro beijo: pura baba



DEPOIS DAQUELE BEIJO DE ADEUS

O beijo de adeus
estalou feito uma tacada de sinuca
num pacau de bico
e eu fui rolando
bola sete na caçapa do canto.

O beijo mordeu o adeus.
O beijo amor deu ao diabo.

Beijo de adeus:
até hoje fujo
do sujo babujo
que cujo beijo
me deu.

terça-feira, janeiro 25, 2005

umas sereias em minha vida

**
Eu sei que já saiu no meu blog mater (http://palavradepantera.blogspot.com : visite e diga que me ama), mas ocorre que eu di umas guaribadinhas cirúrgicas no texto, e postando deste jeito interestrófico a audiência terá chance de acompanhar de perto as estripulias e traquinagens tradutórias... Oxalá a Zoe me perdoe.

Mas então, não querendo abusar da vossa hebetude (o número de comentários tende a zero quando posto traduções, que são a tônica do nosso blog herói), aí vai: divirtam-se.


LORELEI


It is no night to drown in:
A full moon, river lapsing

Black beneath bland mirror-sheen,

Não é uma noite pra se afogar dentro:
Uma lua cheia, rio decaindo
Negro entre brando brilho-espelho,

The blue water-mists dropping
Scrim after scrim like fishnets
Though fishermen are sleeping,

As neblinas d´água azuis pingando
Fios após fios feito redes de pesca
Apesar dos pescadores dormirem,

The massive castle turrets
Doubling themselves in a glass
All stillness. Yet these shapes float

Os torreões maciços do castelo
Duplicando-se numa superfície
Toda mansidão. Mas flutuam estas

Up toward me, troubling the face
Of quiet. From the nadir
They rise, their limbs ponderous

Formas até mim, perturbando a face
Da quietude. Do ponto mais baixo
Se erguem, seus membros graves

With richness, hair heavier
Than sculptured marble. They sing
Of a world more full and clear

De riqueza, cabelo mais pesado
Que mármore esculpido. Cantam
Dum mundo mais cheio e claro

Than can be. Sisters, your song
Bears a burden too weighty
For the whorled ear's listening

Que o possível. Irmãs, sua canção
Carrega uma carga densa demais
Pra audição do ouvido espiralado

Here, in a well-steered country,
Under a balanced ruler.

Deranging by harmony

Aqui, numa terra bem dirigida,
Sob um governante destro.
Transtornando por harmonia

Beyond the mundane order,
Your voices lay siege. You lodge
On the pitched reefs of nightmare,

Muito além da ordem terrestre,
Suas vozes armam cerco. Hospedam-se
Nos recifes agudos do pesadelo,

Promising sure harborage;
By day, descant from borders
Of hebetude, from the ledge

Prometendo acolhida certa;
De dia, descantam dos limites
A hebetude, e também das janelas

Also of high windows. Worse
Even than your maddening
Song, your silence. At the source

Altas a beira. Pior ainda que
A sua enlouquecedora canção,
O seu silêncio. Na origem

Of your ice-hearted calling --
Drunkenness of the great depths.
O river, I see drifting

Do seu chamado de coração gelado –
Bebedeira das grandes profundidades.
Oh rio, eu vejo derivando

Deep in your flux of silver
Those great goddesses of peace.
Stone, stone, ferry me down there.

No fundo do teu fluxo de prata
Aquelas grandes deusas de paz.
Pedra, pedra, me leve lá pra baixo.


Sylvia Plath

Versão brasileira: Ivan Justen Santana

domingo, janeiro 23, 2005

Receita de quase tudo

*
café da manhã com cereal
torradas que se lasquem
partículas de fruta

depois quem sabe a morte

manhã linda que suspira
massagem nos músculos tensos
música ou só um assobio

depois talvez a morte

almoço com brilho de batatas
descascadas sem esforço aparente
cozidas com verde picadinho

depois numa dessas a morte

tarde de varde ou trabalhando
num ambiente sem repugnância
horário de saída sem ânsia

depois podem vir
o fim do projeto
a barriga do arquiteto
a poeta
o administrador
o garçom
o relógio sem mostrador

a dor
a morte
e o amor

sábado, janeiro 22, 2005

versos velhos para sábados novos

*
porque hoje é sábado
eu acordei mais cedo:
um pouco abobado
um pouco bêbado

e mirando você deitada
ainda dormindo de lado
murmurei ao pé do seu ouvido
todos os segredos
mais sagrados da minha vida

ainda dormindo de lado
você sorriu uma gargalhada
e sussurrou que essa piada
eu já tinha te contado

quarta-feira, janeiro 19, 2005

Faça 666 Ferlinghettis felizes com seus comentários (último e derradeiro adeus)

**
COME LIE WITH ME AND BE MY LOVE

Venha deitar comigo e ser meu amor
Amor minta comigo
Jaza aqui comigo
Ao pé do cipreste
No doce gramado
Onde o vento fenece
Onde o vento perece
Enquanto a noite marca passo
Venha deitar comigo
A noite toda comigo
E me beije até se fartar
E se farte de fazer amor
E deixe nossos eus falarem em par
Por toda a noite ao pé do cipreste
Sem fazer amor
**
Lawrence Ferlinghetti
(Starting from San Francisco, 1961)
Versão brasileira: Cardoso & Santana Translation Productions

terça-feira, janeiro 18, 2005

Diga 33 vezes Ferlinguete-se (dou-lhe duas...)

**
Heaven...


________O céu

______________andava a meio palmo aquela noite

__no recital de poesia

_________escutando frases requentadas

____quando ouvi o poeta ter

_______________________uma ereção rimada

___________e então mirar a distância

____________________com o olhar perdido

_____“Todo animal” ele disse finalmente

_______“Depois de transar entristece”

___Mas os casaizinhos do fundão

___________________pareciam distraídos

___________e sem estresse



Lawrence Ferlinghetti

(Pictures of the Gone World, 1955)

Versão brasileira: Cardoso & Santana Translation Productions

segunda-feira, janeiro 17, 2005

Diga três vezes Lawrence Ferlinghetti (parte I)

h
O que ela ia dizer pro ursinho fantástico...


O que ela ia dizer pro ursinho fantástico

e o que ela ia dizer pro seu irmão

e o que ela ia dizer

_________________pro gato com patas de oráculo

e o que ela ia dizer pra mãe

depois daquela vez que se deitou deleitosa

_____________________________entre as doces flores

_______na margem quente do regato

___________onde os fetos desfaleciam no ar alquebrado

_______________da respiração do seu amado

______e os pássaros despirocavam

_______________________e se atiravam

pra saborear ainda quente no chão

_____________a semente de esperma esporramada


Lawrence Ferlinghetti

(A Coney Island of the Mind, 1958)

Versão brasileira: Cardoso & Santana Translation Productions

domingo, janeiro 16, 2005

V I E L A

*
vi ela na avenida sinuosa

insinuando orquídeas e perfídias

artificiosas

bebendo copos de leite

e vomitando rosas


me desentrevei numas trovas

tropecei no pé de sorridentes leprosas


me refugiava na poesia

enquanto ela

toda cheia de dedos

se evadia da prosa



Francisco Cardoso

Ivan Justen Santana

sábado, janeiro 15, 2005

LORELEI

Philip Chevron (The Pogues)
versão brasileira: Ivan Justen Santana
You told me tales of love and glory
Same old sad song, same old story
The sirens sing no lullaby
And no-one knows but Lorelei
Você cantou amor e glória
A mesma velha, triste história
Sereias não nanam neném
E só quem sabe é Lorelei

By castles out of fairy tales
Timbers shiver where once there sailed
The lovesick men who caught her eye
And no-one knew but Lorelei
Castelos dos contos de fada
Troncos chiando onde navegaram
Os corações que a viram bem
E só quem soube: Lorelei.

River, river have mercy
Take me down to the sea
For if I perish on these rocks
My love no more I´ll see
Rio, rio, piedade
Só me leve até o mar
Pois se eu cair nestes rochedos
Não poderei amar

I´ve thought of you in far-off places
And puzzled over lipstick traces
So help me God, I will not cry
And then I think of Lorelei
Pensei em você em terras longínquas
Pistas confusas noutras línguas
Por minha fé, nunca chorei
Então eu penso em Lorelei

I travel far and wander wide
No photograph of you beside me
Ol´man River´s not so shy
And he remembers Lorelei
Eu viajei por todo lado
Sem ter ao menos o seu retrato
O velho do rio sorri também
Ele recorda Lorelei

River, river have mercy
Take me down to the sea
For if I perish on these rocks
My love no more I´ll see
Rio, rio, piedade
Só me leve até o mar
Pois se eu cair nestes rochedos
Não poderei amar

If I should float upon this stream
And see you in my madman´s dream
I´d sink into your troubled eyes
And none would know ´cept Lorelei
Se eu flutuar nessa corrente
E vir você na minha mente
No seu olhar mergulharei,
Quem vai saber: só Lorelei

River, river have mercy
Take me down to the sea
For if I perish on these rocks
My love no more I´ll see
Rio, rio, rio, piedade
Só me leve até o mar
Pois se eu cair nestes rochedos
Não poderei amar

But if my ship, which sails tomorrow
Should crash against these rocks
My sorrows I will drown before I die
It´s you I´ll see, not Lorelei
Mas se o meu barco amanhã cedo
Bater direto nestes rochedos
Meu sofrimento afogarei
Verei você e não Lorelei

sexta-feira, janeiro 14, 2005

A DEZ MÃOS

*

Upgrade de Deus

Eu sou onignorante
dia sim dia não
mal levo adiante

meu DNA é a bichinha
da mosca da merda do cachorro
do cavalo do bandido

quanto mais Buda virar o bundão
mais aumenta o corinho do Alcorão


Catarina Velasco
Edilson Del Grossi
Ivan Justen Santana
Sérgio Viralobos
Thadeu Wojciechowski

quarta-feira, janeiro 12, 2005

Matando saudades da morte

(e atendendo aos insistentes pedidos)

Pra melhor fruir minha canção de amor à morte, é bom saber que eu a fiz inspirado por uma cançãozinha infantil que uma priminha minha me ensinou em tenra idade, versando assim:

Fui no cemitério,
tério tério tério

Era meia-noite,
noite noite noite

Vi uma caveira,
veira veira veira

Era vagabunda,
bunda bunda bunda

Olha o respeito,
peito peito peito


Então, a mistura de sexo e terror sempre foi pra mim muito divertida e perfeitamente apropriada pras almas infantis feito a minha. Cantem comigo:


AMORTE

Eu fui no cemitério
Pra me encontrar com a morte
Eu tava bem travado
Eu tava bodeado

*corinho sinistro*
Me encontrar com a morte
(repete)

Lá longe eu vi um vulto
Ela estava chegando
As névoas me abraçaram
As trevas me engoliram

*corinho sinistro*
A morte está chegando
(repete)

E fomos prum motel
Onde eu a penetrei
Ela me disse agora
E eu confesso que gozei

*gemidos maliciosos*
penetrando a morte
(repete)

Acordei ressaqueado
Com os nervos em frangalhos
Então vi seu bilhete
Ela tinha me deixado

*uivos*
A morte me deixou
*lamentações*
Ela me abandonou

E hoje vivo louco
Procurando minha morte
Mas nunca mais vou ter
Aquela mesma sorte

De
*corinho sinistro*
Me encontrar com a morte
*corinho sinistro*
Me encontrar com a morte


Ivan Justen Santana

(1989)

terça-feira, janeiro 11, 2005

HOT DOG COMPLETO

*
CADELA COR-DE-ROSA

O sol está brilhando e hoje o céu é de brigadeiro.
Guarda-sóis vestem a areia com as cores de janeiro.
Nua, você atravessa a avenida no seu passo ligeiro.

Nossa, nunca tinha visto uma cadela tão pelada!
Nua, sem um fiapo sequer cobrindo a pele rosada...
A turma de transeuntes abre alas, apavorada.

Claro que ao menor sinal de raiva o povo já se esconde.
Mas você não é louca: aliás, o seu olhar tem tom de
inteligência, apesar do corpo ter sarna. Onde

estão os filhotes? (Mãe na certa, pelas tetas cheias.)
Talvez tenha escondido as crias nessas favelas feias,
enquanto sobrevive esperta, gingando nas areias.

Não sabe da última? Manchete em todos os jornais:
o drama social dos mendigos já não existe mais –
estão todos sendo atirados nos rios e nos canais.

Pois é: o idiota, o paralítico e o parasita
vão boiando pelas marés de esgoto, na noite aflita
dos subúrbios, em cantos da cidade que a luz evita.

Se eles são capazes dessa atrocidade com pedintes
de uma, duas ou nenhuma perna, com bebuns errantes,
o que é que não vão fazer com cães quadrúpedes e doentes?

Nos botecos e nas esquinas corre agora uma piada
dizendo que o mendigo prevenido hoje em dia arrecada
troco pra comprar seu colete salva-vidas. Mas nada

podia ser pior que o seu estado se fosse o caso
de ter que flutuar, ou nadar cachorrinho até mais raso
possível. Veja bem: a solução mais prática e razo-

ável é vestir uma camisa listrada e sair por
aí. Nesta noite você não pode mais causar dor
nos olhos dos foliões. Mas ninguém vai ver um cachor-

ro mascarado e fantasiado nos dias de festa
carnavalesca. Até quarta-feira de cinzas resta
a euforia. Quais sambas você gosta? Quais detesta?

Estão dizendo que o carnaval anda degenerando
– a televisão, os gringos, ou sabe-se lá que bando
arruinou toda a folia. Bobagem. De vez em quando

tentam abalar o nosso evento mais sensacional.
Mas ser uma cadela depilada vai pegar mal.
Vista-se! Vista-se logo e vá pular o Carnaval!


Elizabeth Bishop (1979)


Pentadecassílabos brasileiros: Ivan Justen Santana

(publicado originalmente em 1995, no jornal Calamidade,
do Centro Acadêmico de Letras da UFPR)

domingo, janeiro 09, 2005

Postagem desabafo com pedaço de cadela

_

Voltei de novo da Riviera da Januária. Os fogos de Copacabana foram lindos, principalmente com a fumaça e o trânsito na volta. Amanhã é trabalho novamente. Jeito bom de começar o ano: corpo queimado e coração ardendo.

A freqüência desta bodega aqui está caindo vertiginosamente. Então logo mais vou postar a letra duma canção de amor à morte que fiz, pra tentar impressionar. Antes vai uma tradução feita dez anos atrás, do poema Pink Dog, de Elizabeth Bishop. Só que como não a tenho em mãos (nem a tradução nem a Elizabeth), ponho agora só um gostinho da criatura, até onde me lembro. Porra, reajam, digam alguma coisa, senão pego a bola e vou pra casa.


CADELA COR-DE-ROSA

O sol está brilhando e hoje o céu é de brigadeiro.
Guarda-sóis vestem a areia com as cores de janeiro.
Nua, você atravessa a avenida num passo ligeiro.

Nossa, nunca tinha visto uma cadela tão pelada...
Nua, sem um pelo sequer cobrindo a pele rosada.
A turma de transeuntes estacava, aterrorizada.

(...)

quinta-feira, janeiro 06, 2005

Emotional Weather Report

=

Céu da boca encoberto, com possíveis pancadas de loucura até o final do período. Rajadas de ódio e instabilidades imprevistas: sol a pinel. Inconsistência deliberada, vontade de mandar todo mundo ter um péssimo ano. Tempo se esgotando, paciência idem. Amores fugindo, entusiasmo idem. Inspiração seca, boa vontade idem. Idem idem, e por favor não voltem.

quarta-feira, janeiro 05, 2005

Furando a greve

_

Já que pouca gente me leva a sério (exclusive eu) aí está a primeira postagem deste ano, apesar do fracasso do dramático apelo por dez comentários, que bem que mereceu as admoestações maternais e camaradas.

A seguir cenas dum poema canhestro.



Prece a São Conjuga


Ela está na américa

Tu tá na áfrica

Eutanásia